Já fazem alguns anos que tenho trabalhado em traduções de biografias de grandes servos de Deus e desejo agora disponibilizar algumas destas biografias em uma nova série de postagens. Os personagens avulsos que serão aqui abordados incluem ministros reformados, missionários evangélicos, esposas e filhos destes ministros, personagens reais do período da Reforma Protestante, cientistas, médicos e estudiosos cristãos históricos, bem como crentes ordinários que não se tornaram tão conhecidos, mas que serviram fielmente ao Senhor em suas respectivas vocações.
Não tentarei organizá-los em ordem cronológica, visto que isso impediria o retorno a determinado período da história da Igreja. Trataremos de vidas muito diferentes, de culturas diversas, de personagens que atuaram nas mais distantes e remotas áreas do mundo, provenientes de épocas tão distintas, contudo, todos partilhavam a mesma fé, e este é o vínculo que nos une a elas: a fé em Cristo e o serviço ao reino de Deus.
Que as vidas de cada um destes nossos irmãos (ou irmãs) em Cristo possa nos informar um pouco melhor sobre o período no qual eles viveram, sobre a perseguição a qual se submeteram, e sobre o Salvador que os sustentou e livrou, de modo que venham a nos inspirar a seguirmos não somente os seus bons exemplos, mas também ao seu Senhor e Salvador!
Soli Deo Gloria.
Iniciaremos esta série de biografias com a vida de Idelette D'Bures, esposa de João Calvino. Penso que a vida de Idelette, por ser pouco conhecida e por ter sido talvez eclipsada pela vida e pelos feitos teológicos de Calvino, merece destaque como um exemplo de esposa que exerceu tão propriamente o seu papel de auxiliadora, que ela se contentou em ter o seu próprio nome ofuscado pelo nome do seu esposo.
A biografia abaixo foi retirada de um capítulo do livro "Grandes Mulheres da Reforma", de James I. Good, traduzido e publicado pela Editora Knox Publicações em 2009. Se você tiver interesse em adquirir o título completo, clique no link para a loja virtual da Knox Publicações: http://loja.knoxpublicacoes.com.br/products/grandes-mulheres-da-reforma.
IDELETTE D’BURES, ESPOSA DE CALVINO - PARTE I
A esposa de Calvino é uma figura quase
desconhecida, mas muito interessante e digna de um lugar de grande proeminência
entre as mulheres da Igreja Reformada. Calvino não pensou em casamento até os seus
trinta anos de idade, quando ele veio a Estrasburgo, em 1539. Foi então que ele
teve mais tempo livre para considerar esta importante questão. Os seus amigos
também o pressionaram para casar. Os seus bem-intencionados amigos tinham
ansiosamente se preocupado com isso desde muito antes que ele próprio; visto
que ele já tinha mais de trinta anos de idade quando começou a seriamente
considerar essa questão.
Uma serva irada o fez pensar em procurar por
uma esposa. Pois ela tinha um temperamento tão doentio, que um dia ela falou
com tanta impertinência a Antoine, irmão de Calvino, que ele deixou a casa
dizendo que nunca mais entraria ali enquanto ela estivesse lá. Ao que ela
replicou: “Então eu também vou embora”; e ela deixou Calvino sem ninguém para
auxiliá-lo. Assim, desejando livrar-se das preocupações mais triviais da vida,
a fim de que pudesse se dedicar mais plenamente ao trabalho do Senhor, ele
começou a procurar pela pessoa mais adequada para ser sua esposa; ou melhor,
ele deixou que os seus amigos a procurassem por ele, pois pensou que eles
saberiam escolher melhor do que ele próprio. Mas Calvino reservou para si mesmo
a decisão final quanto a esta questão.
Aparentemente, ele recebeu a recomendação de
várias moças. “Foi-me oferecida”, ele escreveu para Farel, o seu amigo mais
chegado, “uma moça que era rica, jovem e de nobre nascimento, e cujo dote
excedia a tudo o que eu poderia desejar. Duas coisas, no entanto, me incitaram
a recusá-la: o fato de ela não falar francês, e de me parecer que ela se
orgulhava demais do seu nascimento e da sua educação.”
A maior dificuldade que Calvino
experimentou foi com relação às qualidades morais da pessoa que ele procurava.
Ele olhava para além da mera beleza de rosto ou de forma física, e buscava por
verdadeira beleza de alma. Ele diz que “ele desejava uma esposa que seria
gentil, pura, modesta, econômica, paciente, e para quem o cuidado do seu esposo
fosse a questão principal”; provavelmente, devido à sua debilitada saúde, ele
sentia necessidade especial do último requisito mencionado. Ele evidentemente
tinha um elevado ideal da esposa que desejava. De fato, tem sido dito que o seu
casamento não foi tanto de coração quanto foi de cabeça; e que foi realizado
não apaixonadamente, e sim mais como uma questão de negócio. Ele tem sido
considerado, portanto, como um esposo frio, porém gentil. E isso parece, em
algum sentido, natural para alguém como Calvino, que era tão eminentemente
intelectual. E mesmo assim, D’Aubigne diz: “Esse fato me parece duvidoso; pois
uma vez casado, ele tinha uma genuína afeição pela sua esposa. Havia no seu
casamento, cremos nós, um enorme intelecto e um gênio sublime, mas também
aquele amor familiar e aquelas afeições do coração que completam o homem.”
Estes altos ideais de Calvino só revelam o
quão elevado deve ter sido o caráter de Idelette De Bures (Van Buren), para ter
sido capaz de preenchê-los. Quando Calvino já havia procurado por uma esposa
até estar prestes a desistir, Bucer chamou a sua atenção para Idelette, visto
que Bucer a conhecia pela sua piedade, sua atenta delicadeza e ternura, e poder
de auto-sacrifício como esposa, viúva e mãe. Ela havia fugido de Liege por amor
à sua fé Protestante, e havia casado com John Storder, que fora um Anabatista,
mas ambos haviam sido convertidos à fé Reformada por meio dos esforços de
Calvino. Desse modo, Calvino havia sido apresentado a ela antes da morte do seu
esposo. Aparentemente, porém, ela estava vivendo de forma tão reclusa, que ele
não pensou nela de início. Ele, no entanto, veio a notar a sua fé profundamente
estabelecida e a sua devota afeição e coragem cristã, as quais a haviam feito
desistir de tudo pela sua fé. Foi então que Calvino a pediu em casamento, e ela
aceitou.
O casamento ocorreu em primeiro de Agosto
de 1540. Foi uma cerimônia grande e pública; algumas das cidades suíças, tais
como Neuchatel, foram representadas por deputados. Os amigos de Calvino na França
também compareceram ao casamento. Calvino estava muito feliz depois do
casamento. Ele chamou Idelette de “a excelente companheira da sua vida, e
sempre fiel assistente do seu ministério”. Ele acreditava no que a Bíblia diz:
“aquele que acha uma esposa, acha o bem, e obteve a benevolência do Senhor”. D’Aubigne
chama atenção para o fato de que o motivo pelo qual nós sabemos tão menos sobre
ela do que sabemos sobre a esposa de Lutero é porque Calvino escreveu bem menos
sobre ela. E ele fez isso propositadamente, pois o que Calvino mais apreciava
em seu coração com relação a ela era a sua modéstia. Ele, portanto, tinha um
senso tão forte do que é conveniente, que preferiu não a expor em suas cartas
ou em seu trabalho mais do que ela gostaria que ele o fizesse. Para ele,
também, tudo era governado pela preocupação com a obra de Cristo, e todos os
seus assuntos privados e domésticos eram eclipsados por isto. Por esta razão é
que ele escreveu menos sobre ela do que Lutero e, portanto - infelizmente para
nós -, sabemos tão pouco sobre ela. Mas até mesmo este silêncio já é, em si
próprio, um belo tributo ao seu caráter.
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