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* Trecho extraído da Obra: O Princípio da Educação, por Karis B. G. Anglada Davis, da Parte 1: A Educação no Éden:
O Princípio da Excelência Educacional.
A Bíblia como a Fonte da História da Educação Cristã
O leitor pode ainda estar pronto para fazer
mais uma pergunta básica: Por que eu deveria crer no Éden, nesta história tão
remota e em sua explicação e interpretação educacional? Qual a fonte dessa
história educacional cristã? Ela é autoritativa e confiável? Como ela chegou
até nós? Quais as credenciais do historiador? Que cientista a descobriu? Ou que
filósofo a explicou? A questão que está em jogo é se a visão bíblica do mundo
original é uma teoria ou um fato, se a educação deve ir a Bíblia com suas suposições
e críticas, ou se esta se apresenta como verdade e autoridade para a educação.
A veracidade e a autoridade da revelação bíblica
O início da história bíblica e a visão de
mundo que orienta a educação cristã não foi inventada por homens, nem proposta
por grandes filósofos ou teólogos. Este é precisamente o caso das muitas
filosofias educacionais atuais, não raro chamadas pelo nome de seus criadores,
que, como bem sabemos, não passam de criaturas falíveis e limitadas. Pelo mesmo
motivo, essas cosmovisões têm falhas, lacunas e enganos que o próprio tempo
insiste em apontar. A visão de mundo apresentada nessa história educacional que
estaremos contando é uma cosmovisão revelada.
Seus princípios e pressupostos nos foram dados de fora, de cima, de maneira sobrenatural,
inspirada e inerrante por Aquele que é onisciente e inalcançável, mas que
escolheu Se revelar aos homens por meio de letras humanas, o próprio Deus vivo
e verdadeiro, o Criador e Sustentador do Universo, a Sabedoria em pessoa, ou,
como o apóstolo João o apresenta: o Verbo, a própria Palavra criadora, a Palavra
final.
Uma das principais provas de que a visão de
mundo bíblica é única e verdadeira é que ela nos revela coisas que jamais
poderíamos descobrir ou deduzir pela pesquisa humana. Trata-se de uma história
que não poderia ser inventada ou concebida por homem algum. Que mortal poderia
ter autorado aquelas inescrutáveis sentenças: "No princípio, criou Deus os
céus e a terra. A terra, porém, estava sem forma e vazia; havia trevas sobre a
face do abismo, e o Espírito de Deus pairava por sobre as águas" e
"Disse Deus: Haja luz, e Houve luz!"(Gn. 1:1-3)? A narrativa bíblica
do início do mundo e da história do Éden chega a nós com o peso e a autoridade
da própria palavra de Deus, como sendo a interpretação divina das coisas, revelada
a nós no livro de Deus. J. Gresham Machen nos assevera sua autoridade:
A Bíblia é o livro de Deus, não do homem.
Outros livros dão conselhos bons e conselhos maus; este livro nos dá apenas
conselhos bons, ou melhor, ele nos dá mandamentos que vêm com toda a autoridade
do soberano Deus. Eu não estou tentando apresentar a vocês coisas que eu
descobri por mim mesmo, e eu não estou tentando ajudá-lo a descobrir coisas por
vocês mesmos; mas eu estou pedindo a vocês que ouçam juntamente comigo ao que
Deus nos falou em Sua Palavra.[1]
Como indica Machen, a única resposta
aceitável de nossa parte é acatar, com gratidão, humildade e espanto, a
simplicidade e a clareza de uma verdade histórica que não tínhamos nem a
capacidade nem o direito – mas que temos o privilégio! – de possuir. Por mais
longe que os historiadores da educação não-cristãos queiram ir, e por mais que
eles busquem os fundamentos da educação na antiguidade mais remota, eles não
podem contar o início da história.
Somente os cristãos podem contar a história
da educação humana desde o seu início, descrevendo o seu contexto, o primeiro
ambiente educacional, o seu Professor, o seu aluno, o seu conteúdo, e podem, a
partir dessa visão original, compreender o sentido e o propósito da educação.
Isso só é possível porque a fonte dessa história tão antiga não está no próprio
homem, em suas imaginações filosóficas ou descobertas arqueológicas. Ela está
em Deus. Somente Deus conhece o início da história, e pode nos esclarecer essas
questões tão essenciais. E Ele revelou essa peça tão fundamental do
quebra-cabeça histórico-educacional de maneira sobrenatural, inspirando homens
a escreverem de maneira inerrante a Sua própria Palavra. A Bíblia relata
infalível, verdadeira e claramente, com a autoridade do próprio Deus, tudo o
que precisamos saber para explicar, motivar e reger a nossa educação cristã. O
objetivo das Escrituras é contar a história da redenção do homem, e como
veremos ainda neste livro, a história da educação está profundamente intricada
nela.
Além de ser a única fonte autoritativa da
história educacional do homem, a Bíblia é também o único fundamento sólido para
a filosofia educacional cristã, e consequentemente, para toda a prática
educacional. Os princípios educacionais, antropológicos, epistemológicos,
sociológicos, etc. de que precisamos devem emergir do seu ensino. Como assevera
Norman De Jong: “A própria Escritura se torna a base para todo crer, para todo
conhecer, e assim, para todos os pensamentos referentes à educação. É da
Bíblia, a Palavra de Deus para o homem, que o cristão irá aprender”.[2] A revelação escrita de Deus é a única luz que temos para ver o
primeiro momento histórico da educação, e para podermos ter luz em nossa
jornada em busca de uma filosofia educacional cristã. É na sua luz que vemos a
luz (Salmo 36:9). Ela é lâmpada para os nossos pés e luz para o nosso caminho.
(Cf. Salmo 119:98-105).
A singularidade e suficiência da visão original bíblica
Finalmente, devemos enfatizar que essa
visão de mundo oferecida nos primeiros capítulos da Bíblia em forma de um
relato histórico é uma visão abrangente,
suficiente e profunda. Ela trata de todos os tópicos que compreendem uma cosmovisão,
numa ordem lógica e consistente com a realidade: Deus, o homem, o mundo, o
conhecimento, a origem do mal, o propósito da vida e das atividades humanas, a
esperança da humanidade, etc. É uma visão suficiente para explicar coerente e
definitivamente a origem do universo, a maneira pela qual tudo existe e o
propósito de todas as coisas. Ela vai à raiz de todos os problemas e revela
tudo o que precisamos saber com profundidade e precisão.
As culturas pagãs também conceberam
histórias sobre a “origem” do mundo, mas nunca puderam explicar a história
toda. Conceberam deuses que, longe de apresentar os atributos divinos da
onipotência e da auto-suficiência eram seres criados, limitados, cheios de
defeitos e falhas. A própria explicação moderna e supostamente científica da
teoria da evolução, além das várias lacunas e enganos, nunca conseguiu explicar
a origem dos elementos, forças e condições que ocasionaram a famosa explosão do
“Big Bang”, e os seus seguidores estão apoiados em sua fé numa fórmula
anti-científica e jamais provada que postula que [o acaso + milhões de anos =
complexidade do universo e da existência humana].
Nós, cristãos, colocamos nossa fé na
Palavra da Revelação de Deus aos homens, e defendemos a visão de mundo bíblica
que, ao contrário, é precisa e profunda, como estaremos verificando mesmo neste
capítulo incipiente da história. Sobre a singularidade da história bíblica, o
Dr. Lloyd-Jones fez a seguinte afirmação: “A Bíblia nos apresenta uma visão de
mundo definida, concreta e abrangente que é absolutamente diferente de qualquer
coisa que você pode encontrar em qualquer outro lugar”.[3] Sobre a sua relevância, ele afirmou: “Não há um livro mais atual no
mundo do que esse livro antigo, que chamamos de Bíblia. Ele trata de homens e
de mulheres. Ele trata de você. Ele trata de todos nós assim como estamos e
onde nos encontramos. Ele fala à nossa própria condição e nos apresenta um modo
de vida”. [4]. E sobre a sua veracidade, este autor acrescentou:
...a única visão do homem, da mulher e da
vida no mundo que realmente faz jus aos fatos, a única visão que explica porque
nós somos individualmente como somos nesse momento, porque o mundo é como é, e
porque a história tem sido como tem sido, encontra-se nas páginas da Bíblia. Eu
estou aqui para contender que somente esse livro tem uma explicação adequada.
Se você adotar qualquer outra visão, você descobrirá que ela lhe desapontará
num ponto ou noutro. A Bíblia, eu repito, afirma ser um livro único, um livro
dado por Deus de várias maneiras, por intermédio de homens e reunido em um. E o
que ela faz, é claro, é nos dar um relato das coisas que são vitais, primárias
e fundamentais.[5]
E, de fato, Deus começa a Bíblia com
narrativas e acontecimentos fundamentais. A existência de um Deus Pessoal, a
sua obra da criação, a origem do mundo e do homem, a perfeição desse estado
original, o surgimento do mal no mundo, a queda do homem, suas conseqüências
para o homem e para a natureza e o anúncio da vinda de um redentor e da
continuação da história humana até o tempo determinado por Deus para
julgamento; todos esses são temas que determinam a totalidade da visão de mundo
cristã.
Há um sentido incipiente, porém verdadeiro,
em que os três primeiros capítulos da Bíblia nos contam a história toda. Isso acontece
porque o Éden nos revela a intenção original de Deus para a vida do homem no
mundo, como coloca o escritor educacional reformado De Jong: “O primeiro estado
descrito pode ser chamado de estado original ou desejado do homem. Apesar da
narrativa Bíblia desse estado ser muito curta (Gn. 1 e 2), há informação
suficiente ali, e em passagens subsequentes, que podem ser encontradas e
aplicadas ao processo que chamamos de educação”.[6] E o Capítulo 3 de Gênesis nos conta como o homem e o mundo se
afastaram desse ideal divino e se encontram como os conhecemos hoje, e ainda
oferece um raio de esperança ao apresentar a promessa de que os planos de Deus
não seriam ultimamente frustrados, e um dia um salvador viria para desfazer os
efeitos da queda e recriar o homem e o mundo perfeitos. A mensagem do Éden é,
por todos os ângulos, como descreve Lloyd-Jones, essencial para a compreensão da
história e da educação humana. Comentando sobre a importância do capítulo 3 de
Gênesis como o final da importante narrativa compreendida nos três primeiros
capítulos da Bíblia, o Dr. Lloyd-Jones afirma:
Não há dúvida nenhuma de que, julgado por
quase todo ângulo que você queira olhar, Gênesis 3 é um dos mais importantes
capítulos da Bíblia... a Bíblia toda é a história de Deus lidando com homens e
mulheres. É a história da redenção. E o que dá a esse terceiro capítulo do
livro de Gênesis tal importância excepcional é que aqui é-nos contada a
história de como o homem caiu do bom estado no qual Deus o havia originalmente
colocado. Em outras palavras, é o princípio da história humana. [7]
Aplicação Educacional
Sobre a Importância da Revelação Especial de Deus
Pressupostos
e Princípios:
-
A Bíblia como Fundamento para a Educação.
O princípio bíblico-reformado do Sola Scriptura
embasa também a educação cristã. Ela aceita o testemunho dos primeiros
capítulos da Bíblia de que existe um Deus criador que resolveu voluntariamente
se revelar aos homens através das coisas que criou (revelação natural) e de sua
palavra escrita (revelação sobrenatural). Depois da queda do homem no pecado e
por causa da sua cegueira, o ponto de partida agora precisa ser a revelação
escrita, mas estas duas revelações pressupõem e suplementam uma à outra, sendo,
agora, ambas necessárias, autoritativas, suficientes e claras (racionais ou
inteligíveis).[8]
A
Bíblia é para a educação cristã um instrumento precioso e indispensável para a
compreensão do mundo, de nós mesmos e do próprio Deus. Assim como a revelação
que Deus deu de Si mesmo no Éden, seja nas coisas criadas ou na palavra do
mandamento, era a base ou o fundamento de toda a vida e educação de Adão e Eva,
a Palavra de Deus é o princípio e a base
de toda educação cristã, a nossa única regra de fé e de prática,[9] na qual encontramos
“tudo o que o homem deve crer sobre Deus e o dever que Deus requer do homem”.[10] De Jong afirma que a
Escritura é “a base para toda crença, para todo conhecimento e portanto a base
para todos os pensamentos referentes à educação. É da Bíblia, a palavra de Deus
para o homem, que o Cristão irá aprender”. [11] Gangel deixa claro que
esse princípio é uma marca essencial e distintiva da educação cristã:
Qualquer
fundamentação para uma cosmovisão cristã deve começar com as Escrituras. É da Palavra de Deus que recebemos revelação
especial com relação à natureza de Deus, à humanidade, à realidade definitiva,
à bondade e às expectativas da vida. Todas as pessoas têm acesso à revelação
geral (pelo estudo da criação divina) e ao conhecimento acumulado no mundo, no
entanto, somente os cristãos aceitam a Bíblia como a nossa suprema fonte de
respostas sobre a vida. Embora todos os sistemas filosóficos requeiram certa
medida de fé, a crença nas Escrituras nos fornece o sistema mais
intrinsecamente coerente sobre o qual podemos construir uma vida moral e com
propósitos. Os cristãos acreditam que Deus, por intermédio de sua palavra, nos
deu “todas as coisas que conduzem à vida e à piedade, pelo conhecimento
completo daquele que nos chamou para a sua própria glória e virtude (2 Pedro
1:3). [12]
-
A Bíblia como Autoridade na Educação.
A educação cristã tem na Bíblia não somente a sua base ou fundamento, mas
também a sua norma ou padrão. Por ser uma revelação
especial do Autor da educação cristã, a Bíblia é a autoridade suprema para
ordenar, definir e regular a educação em seus princípios e propósitos, em sua
razão de ser, em sua concepção de ensino e de aprendizado, e em seus métodos, conteúdos e administração.
A Palavra revelada de Deus é a autoridade final e juiz supremo de todas as
questões educacionais, e com ela não competem a tradição ou a razão humanas.
Todas as idéias pedagógicas, antigas e novas, devem ser julgadas por ela. Como
colocou Van Til: “O que quer que esteja de acordo com a Revelação de Deus é
educativo. O que não estiver, é dês-educativo”.[13] Engelsma concorda
dizendo que aceitar a autoridade da Bíblia significa que “não ensinamos nada
que esteja em conflito com as Escrituras; apenas ensinamos aquilo que está em
harmonia com ela.”[14]
-
A Bíblia como Luz da Educação.
“Lâmpada para os meus pés é a tua palavra e, luz para os meus caminhos”, diz o
Salmo 119:105. A primeira implicação desse princípio é negativa e revela que,
sem a Bíblia, a educação está no escuro: ela não sabe de onde vem, onde está,
ou para onde vai; ela não sabe o que está fazendo, não tem padrão para julgar o
que é bom e o que é mau, e não tem rumo ou direção. Ela nem sabe em que
tropeça. Isso é uma realidade na educação secular, e pode descrever também as
escolas cristãs se elas não fizerem uso dessa lâmpada para iluminar o seu
caminho. Mas não precisamos andar no
escuro. O princípio da luz, positivamente, dá segurança e rumo à nossa prática
educacional e porque temos a Bíblia, em cuja luz, vemos a luz (Salmo 36:9), nós
podemos ver e reconhecer a verdade. A nossa teoria pedagógica, por exemplo, não
precisa deduzir ou especular sobre a natureza do homem ou do conhecimento, como
afirma Solano Portela:
A Pedagogia redentiva constrói seus postulados
em cima de premissas que são extraídas da Verdade Revelada do Criador. Ela não
precisa deduzir o que é a natureza humana, mas tem o ponto de vantagem de ir
até a revelação proposicional da Bíblia, e extrair objetivamente uma descrição
do que é a pessoa humana, no íntimo do seu ser. Ela pode realizar mil
experiências para reafirmar e fazer a ‘sintonia fina’ de sua metodologia, mas
não necessita ficar perdida num pântano de subjetivismo e de idéias gratuitas
sobre o que move, direciona e motiva as pessoas. Ela não precisa especular
sobre o conhecimento, a sua natureza, o que faz as pessoas aprenderem. Ela tem
pérolas proposicionais que foram escritas pelo próprio autor do conhecimento;
por aquele que é o doador da capacidade de entendimento e da compreensão
humana.[15]
- A Bíblia como Objeto da Educação. A Bíblia é o
fundamento, a norma e a luz do ensino cristão, mas ela deveria ser também o
conteúdo da instrução cristã? O ensino bíblico de várias passagens-chaves no
antigo e no novo testamento (Dt. 6:6-9; Salmo 78:1-8; II Timóteo 3:14-17) nos
dão um ressonante sim! Essas
passagens afirmam explicitamente que o conhecimento da Palavra de Deus - a lei,
os registros históricos das obras de Deus, os louvores, as admoestações e o
ensino doutrinário - constituem em si um fim e alvo da educação e isto implica
em que as Escrituras precisam ser o conteúdo principal da educação cristã. As
palavras que devem ser inculcadas na mente e no coração das crianças não eram a
sabedoria dos povos pagãos, mas a lei de Deus. Os grandes feitos que deveriam
ser contados de geração em geração não eram as construções dos egípcios, mas os
atos redentivos de Deus registrados na Bíblia. O ensino da Bíblia é o cerne e a
essência da educação cristã.
Essa
afirmação frequentemente levanta a questão de como a Bíblia deve ser ensinada.
Como devocional? Como uma disciplina? Como catecismo? De todas essas maneiras?
Ou de outra maneira? De que maneira ela pode ocupar esse lugar central na
educação cristã? Engelsma sugere que a posição reformada é diferente da posição
evangélica por não confinar o ensino da Bíblia ao culto devocional (que, embora
não precise ser excluído da escola cristã, é tarefa primordial dos pais), nem a
uma disciplina bíblica ou doutrinária (que é tarefa primordial da igreja
juntamente com os pais), mas afirma a necessidade da Bíblia informar toda a instrução das diversas
matérias, até ao mais alto grau. Aqui a educação cobre uma área própria, que a
família e a igreja não têm normalmente condições de exaurir. Ele explica: ‘A
Escritura informa toda a instrução dada na escola cristã. Por “informa” eu
quero dizer “dá a essência de, é a qualidade característica da”. Ela é a luz de
Deus na qual nós vemos a luz.”’[16]. O autor prossegue:
A Escritura deve ser ensinada assim: como o
fundamento, a luz, e o centro de cada assunto. A Escritura deve ser trabalhada
em cada assunto, naturalmente e como um fato óbvio, como o chão sobre o qual
cada aspecto da realidade está solidamente firmado. Ela deve ser a luz que
ilumina não somente o aspecto particular da criação de maneira a lhe dar
significado, mas também ilumina o próprio aluno, sobre o que deve fazer em
relação ao conhecimento e uso daquele aspecto da criação. E ela deve ser
ensinada como a coluna, ou o centro de cada assunto. Assim, ela unifica todos
as disciplinas. [17]
Como
a luz de Deus, a Escritura é o fundamento de todo assunto, controlando-o,
dirigindo-o, e explicando-o, e assim tornando o que é meramente verdadeiro uma
verdade de Deus. Como podemos ensinar história se ela não for firmada e
iluminada pela Palavra que ensina um Deus soberano, a centralidade de Cristo, a
grande guerra entre o reino de Deus e o reino deste mundo, a depravação total
do homem, e os julgamentos de Deus sobre o pecado? Como podemos ensinar ciência
a parte da Palavra sobre a criação, sobre a queda e a maldição sobre o homem e
sobre a sua terra, sobre o dilúvio, e sobre a sabedoria e poder do Criador?[18]
A
Bíblia deve, portanto, informar o ensino de cada assunto dentro da matemática,
da história, da física e da educação física. Ela deve fazer isso da pré-escola
ao mais avançado grau imaginável. Ela fornece a essência do que a criança ou o
adulto precisa aprender na geometria, na queda do império romano, na lei da
gravidade e nas regras do futebol. E como a Bíblia ilumina, fundamenta,
esclarece, controla e explica as verdades geométricas, ou históricas, ou
físicas, etc.? A chave é dada por Engelsma: “tornando o que é meramente
verdadeiro uma verdade de Deus”, ou seja, relacionando o assunto particular ao
plano de Deus e mostrando como cada verdade provém de Deus e deve voltar para
Deus. Segundo a Bíblia, qual é a essência da geometria? Ela não está na
perfeição, na ordem, na exatidão do plano e da vontade de Deus? O que as
medidas da arca, do templo, da cidade santa em Apocalipse revelam sobre a
essência da geometria? Na História, somente quando a queda do Império Romano é
associada à desobediência a Deus por parte daquele povo, e à Soberania de Deus
em levantar e derrubar impérios (Dn. 2:20) é que esse “mero acontecimento” é
tornado um “acontecimento de Deus”. Procuraremos dar a seguir algumas sugestões
práticas de como isso pode ser feito.
Vale
lembrar ainda um aspecto enfatizado por Engelsma, que “o ensino da Escritura
dessa maneira não deve ser concebido à parte do conteúdo da Escritura”[19] (sobre Deus, sobre a criação,
sobre a queda e a antítese entre a cidade de Deus e a cidade dos homens, sobre
Cristo e a igreja, sobre o julgamento final, etc.) e isso requer um
conhecimento sistemático ou doutrinário das verdades bíblicas. Este autor chega
a sugerir que os professores cristãos devem ser versados nos símbolos de fé
reformados, devem confessá-los de coração e devem fazer uso constante e ativo
desses credos que entendemos ser a interpretação verdadeira e permanente do
ensino e dos princípios bíblicos para toda a vida. Um uso apropriado das
confissões de fé e catecismos cristãos como expressão do ensino bíblico é capaz
de, segundo este autor, enriquecer, libertar, direcionar e garantir a certeza e
o sucesso do trabalho educativo.
Direcionamentos
Práticos:
-
Para saber se o seu ensino, a sua teoria pedagógica, as suas práticas de
administração, supervisão ou coordenação escolar são de fato cristãs, faça a si
mesmo a seguinte pergunta: Qual a base ou a explicação bíblica que eu posso dar
para isso que estou fazendo? A Bíblia é necessária e indispensável à minha explicação?
Quem tem a palavra final nesse assunto? A Bíblia ou alguma teoria ou tradição
pedagógica? A minha explicação pressupõe que a Bíblia é suficiente e
inteligível para fundamentar essa teoria ou prática educacional, ou eu tenho a
tendência de pensar que somente o teórico tal ou o livro tal têm respostas
nessa área?
-
Busque conhecer cada vez mais a Bíblia, estude teologia, estude as confissões
de fé reformadas, faça uso de cada pregação que você ouve e de cada livro ou
passagem devocional que você lê e busque aplicar cada verdade bíblica à educação
a partir da seguinte indagação: que luz esse ensino bíblico lança sobre a minha
especialidade de ensino? Como esta verdade bíblica informa, regula, controla,
dirige ou fornece princípios essenciais para a minha matéria? Vá relacionando
essas considerações em um mural ou caderno acessível, e releia esses princípios
durante o preparo de suas aulas. E caso você seja tentado a pensar que um
determinado relato ou doutrina bíblica não tem nada de novo a acrescentar à sua
área, peça a Deus por sabedoria e luz para a sua visão, lembrando de II Timóteo
3:16,17: “Toda a Escritura é inspirada por Deus e útil para o ensino, para a
repreensão, para a correção, para a educação na justiça, a fim de que o homem
de Deus seja perfeito e perfeitamente habilitado para toda boa obra."
-
Em face do currículo que você foi encarregado de ensinar, faça da Bíblia o
padrão para distinguir o que é educativo e o que é deseducativo. O que estiver
de acordo com a Bíblia é educativo e deve ser ensinado positivamente, com
vistas a que os alunos compreendam e aceitem pela fé, e se comprometam de
coração a pôr em prática essas verdades em suas vidas. O que contrariar o
ensino bíblico é deseducativo, e não deve ser ensinado a não ser como exemplo
negativo, como instrumento de crítica e de discernimento da antítese entre o
reino de Deus e o reino deste mundo. Isso implica dizer que nós não “ensinamos”
(no sentido mais profundo do termo) a evolução, o marxismo, e o liberalismo,
por exemplo, ao aluno. Nós estudamos e analisamos essas e outras idéias à luz
do ensino das Escrituras, mostrando a falsidade, os perigos e os resultados
terríveis dessas e de tantas outras idéias que contrariam o ensino bíblico.
-
Use a Bíblia e a interpretação dos Símbolos de Fé reformados em cada aula. Faça
uma pesquisa dos textos bíblicos principais que são capazes de informar, lançar
luz ou orientar o assunto que você está prestes a ensinar, direta ou
indiretamente. Identifique os princípios ou as verdades essenciais que a Bíblia
revela sobre este assunto e enfatize estes aspectos como a lição mais
importante a ser aprendida, como o significado verdadeiro e mais importante
desse fato. Prossiga com as demais informações que você tiver para acrescentar,
mas retome no final, de maneira aplicativa, os princípios bíblicos examinados.
Se nós cremos na suficiência da Bíblia, precisamos afirmar que é possível fazer
isso em toda matéria e em cada assunto específico.
-
Jan Waterink sugere ainda, no que diz respeito ao uso da Bíblia em sala de
aula, que o professor tenha a Bíblia aberta diante de si, leia os textos
apropriados com os alunos, e, na medida que isso for possível, exija dos alunos
que eles mesmos leiam, pesquisem e façam uso da Bíblia, a fim de cumprirmos
nossa função como educadores cristãos de “levar a Bíblia à criança e a criança,
à Bíblia”.[20] E quanto ao ensino das doutrinas
bíblicas, a sugestão é que elas sejam ensinadas não apenas na aula de educação
religiosa (se houver), mas também em seu relacionamento com todos os assuntos
estudados nas diversas disciplinas, e de acordo com a capacidade e idade do
aluno. Talvez a doutrina da queda possa ser especialmente elucidativa em uma
aula complicada e cansativa de gramática para explicar a dificuldade e o suor
envolvidos no aprendizado de línguas depois da queda e de Babel. Ou quem sabe
uma pergunta do catecismo infantil, como a seguinte: “Pergunta: Deus se
desagrada daqueles que se recusam a amá-lo e a obedecê-lo? Resposta: Sim. Deus
está irado com o pecador todo dia”, pode ser usada para sugerir a realidade das
trombetas e juízos de Deus nos terremotos, guerras e catástrofes históricas e
geográficas.
-
Exemplo de como as Escrituras podem ser usadas na sala de aula. Inúmeros
exemplos poderiam ser dados em todas as matérias sobre o uso das Escrituras e
de seu ensino na sala de aula. A Bíblia tem muito a dizer sobre números, sobre
história, sobre geografia, sobre ciências, sobre estudos sociais, sobre física,
sobre o corpo humano, sobre nutrição, sobre a linguagem, sobre tecnologia, etc.
Mas não há espaço para mais do que um único exemplo com vistas a esclarecer
esta sugestão: Digamos que você esteja ensinando os animais selvagens à
terceira série, e hoje a aula seja sobre o leão. Ao invés de começar com o
filme do Rei Leão, ou com seu habitat na África, ou com sua posição na cadeia
alimentar, comece com as verdades reveladas na Bíblia sobre o Leão. Faça uma
pesquisa sobre o que ela revela sobre esse animal, e você se surpreenderá com a
quantidade de informações diretas e indiretas que você encontrará sobre esse
único ser. Pouco ou muito, creia que a informação bíblica será clara e
suficiente para compreendermos o sentido mais profundo e verdadeiro desse
animal, que em sua essência está relacionado com Deus.
Você o encontrará, por exemplo, em Gênesis 1
entre os animais selváticos criados por Deus e declarados como bons. Você
constatará a sua posição entre os demais grupos de animais e a provisão de Deus
em preparar-lhe um ambiente e alimentação especial (Gn 1:30), e você se deparará
com a constatação surpreendente de que, em seu estado original, o leão não era
carnívoro nem predador. Sua criação por Deus e sua posição entre os demais
animais também revela o poder, a beleza, a majestade, a força e a sabedoria de
Deus. A segunda e terceira perguntas do catecismo infantil[21] também podem ser
usadas para mostrar que o Leão foi criado por Deus para a Sua glória. O fato de
ter sido salvo na arca revela o valor que Deus dá à preservação dos seres
criados, do leão à formiga. O fato da queda afetou tanto a sua constituição
física como o relacionamento entre o leão e demais seres criados, especialmente
com relação ao homem. Seu caráter agora ofensivo e implacável é um alerta à
estratégia de Satanás (1 Pe. 5:8), e ao julgamento divino (Os. 5:14;13:8; II
Reis 17:25). O Salmo 104:21 fala do seu modo de vida como sendo guiado por Deus
e dependente de Deus. Sua natureza ousada e destemida faz dele um exemplo para
o crente (Pv 28:1). No mundo vindouro, ele é restaurado à sua condição
original, sendo visto pastando com o cordeiro em Isaías 11:6 e 65:25 na criação
redimida por Cristo.
Mais
do que criado por Deus, afetado pela queda e redimido por Cristo, o Leão tem
seu significado maior como tipo de Cristo, do poder e da majestade daquele que
é o Leão da tribo de Judá. (Ap. 5:5) E a Bíblia também aplica essas verdades à
vida do aluno de maneira apropriada, ensinando-o a depender de Deus, a
preservar os animais, a temer a fúria do Leão, a conhecer e temer a Cristo e a
ansiar pelo estado de glória quando poderá ter um leão como animal de
estimação. Finalmente, você pode ainda ensinar e buscar incentivar a resposta
apropriada dos alunos diante da revelação bíblica, que consiste na aceitação
dessas verdades pela fé, e na gratidão, humildade, espanto e privilégio que
eles têm de conhecerem essas verdades reveladas que pertencem a eles e a seus
filhos, e que os descrentes desconhecem ou negam. Mostre a importância e a
veracidade de tudo o que nos tem sido revelado por Deus, e quando o filme do
Rei Leão sugerir algo diferente, aproveite para ensinar que a Bíblia é a
Palavra de Deus e tem a palavra final em todos os assuntos. E por falar em
filme, Nárnia seria uma opção muito mais apropriada para retratar o Leão numa
escola cristã!
Próximo Post nesta seção:
Deus como o Autor da História da Educação
[1] Machen, J. Gresham. The Christian View of Man (A Visão Cristã do Homem) (Carlisle: The
Banner of Truth Trust, 2002), p. 15.
[2] De Jong, Norman. Education in the Truth (Educação na Verdade) (Nutley: Presbyterian
and Reformed Publishing Co., 1977), p. 69.
[3] Lloyd-Jones. The Gospel in Genesis, p. 26.
[4] Ibid.
[5] Ibid., p. 10.
[6] De Jong, Education
in the Truth, p. 72-73.
[7] Lloyd-Jones, The Gospel in Genesis,
p. 26.
[8] Cf. Van Til, Cornelius. Christian
Apologetics (Apologética Cristã) (Phillipsburg:
Presbyterian and Reformed Publishing Co.,1976). pp. 30-37. Van Til nota e explica como as doutrinas da necessidade, da
autoridade, da suficiência e da clareza da revelação de Deus se aplicam tanto à
sua revelação escrita como à sua revelação natural. (todas as traduções dessa
obra são feitas pela autora).
[9] O Catecismo Maior de Westminster. In: A Confissão de Fé, O Catecismo
Maior, O Breve Catecismo (São Paulo: Casa Editora Presbiteriana, 1991,
p.165-385), p. 166.
[10] Ibid., p. 168.
[11] De Jong, p. 69.
[12] Gangel, Kenneth O. Fundamentos Bíblicos da Educação. In: PORTELA, S.
et al. Fundamentos bíblicos e filosóficos
da educação. (São Paulo – SP: ACSI/Purposeful Design Publications, 2004),
p. 97
[13] Van Til, Essays, p. 81.
[14] Engelsma, Reformed Education, p. 24.
[15] Fides, p. 148. Citar por completo.
[16] Engelsma, Reformed Education, p. 24.
[17] Engelsma, p. 34.
[18] Engelsma, Ref. Ed.p. 24-25.
[19] Engelsma, p. 34.
[20] Waterink, Jan. Basic Concepts in Christian Pedagogy. (Conceitos Básicos na Pedagogia Cristã) Eerdmans: Grand Rapids,
1954, p. 132.
[21] Pergunta 2: O que mais
Deus fez? Resposta: Deus fez todas as
coisas. Pergunta 3: Para que Deus fez você e todas as coisas? Resposta: Para a sua própria glória.
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