“Como Maçãs de Ouro em salvas de prata, assim é a palavra dita a seu tempo.” (Pv. 25.11)

“Feliz o homem que acha a sabedoria e o homem que adquire o conhecimento;
... é Árvore de Vida para os que a alcançam, e felizes são todos os que a retêm." (Pv. 3:13,18)

sexta-feira, 7 de junho de 2013

A Educação no Éden - Parte 1

                          O ÉDEN COMO O INÍCIO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO


*Trecho extraído da obra: O Princípio da Educação, por Karis B. G. A. Davis, da Parte 1: A Educação no Éden: O Princípio da Excelência Educacional.

Introdução à Parte 1:

“Tudo fez Deus formoso no seu devido tempo; também pôs a eternidade no coração do homem, sem que este possa descobrir as obras que Deus fez desde o princípio até ao fim... O que é já foi, e o que há de ser também já se foi; Deus fará renovar-se o que se passou... A tudo quanto há de vir já se lhe deu o nome, e sabe-se o que é o homem, e que não pode contender com quem é mais forte do que ele”

Eclesiastes 3:11,15; 6:10

Solano Portela afirmou: “... o objetivo da Educação Cristã deve ser o de proporcionar à pessoa que está sendo educada, não apenas a obtenção de conhecimentos variados uns dos outros e da sua própria constituição física e moral, mas sim o de conceder uma visão integrada e coerente de vida, relacionada com o Criador e com os Seus propósitos.[1] Essa “visão integrada e coerente da vida, relacionada com o Criador e com os Seus propósitos” de que Portela fala, e que também chamamos de cosmovisão cristã, é comumente comparada à estrutura de um prédio que contém três colunas principais, ou o tripé: criação-queda-redenção. Essa parte inicial do livro trata dessa primeira coluna: a criação. Não do relato bíblico de Gênesis 1 e 2 em si, mas do seu peso e significado histórico-teológico- filosófico-pedagógico para a educação cristã, ou seja, como uma figura do ideal de Deus para a educação do homem como fora criado. Esse estado inicial ideal e excelente da educação nos revela o início da história educacional e o propósito da vida e da educação do homem no mundo. Quando nos referimos a esse tempo inicial, usamos o termo “no princípio”. Quando nos referimos à qualidade desse estado, usamos o termo “perfeição”. Quando nos referimos ao lugar em que a educação ideal aconteceu, falamos do “Éden”.

Essa parte é formada por cinco capítulos que caracterizam, por sua vez, a origem, o contexto, o aluno, os alvos e o conteúdo curricular do primeiro momento da educação do homem.  O primeiro capítulo nos introduz ao primeiro momento da história educacional, à fonte dessa história, e ao seu autor divino, apresentando vários elementos da cosmovisão original (visão da história, de Deus, de conhecimento e do mundo). O segundo capítulo descreverá a criação como a sala de aula ideal. O terceiro capítulo caracteriza o aluno ideal ou perfeito, ou seja, o ideal de Deus para a educação e formação da pessoa humana. O quarto capítulo trata dos objetivos individuais e sociais da educação do Éden; e o quinto capítulo descreve o currículo original como o modelo divino para dirigir a formação teórica e curricular das escolas cristãs.

 

O Éden como o Início da História da Educação Cristã

No princípio criou Deus os céus e a terra...
... E plantou o SENHOR Deus um jardim no Éden, do lado oriental; 
e pôs ali o homem que tinha formado.
 – Gênesis 2:1,8

Exclamando em voz alta, ou talvez silenciosamente perguntando a si mesmo, você pode estar pensando, ao ler o título acima: “Educação cristã no Jardim do Éden? O que essa alusão a um lugar mitológico da antiguidade tem a ver com a história da educação? Ainda que eu estivesse entre os poucos que acreditam na existência de um paraíso original, a história da educação cristã não pode ser tão antiga, certo?” Nesse caso, supondo que você é provavelmente um educador não-cristão apenas interessado em aprender mais a respeito da história da educação cristã ou de uma história educacional contada do ponto de vista cristão, este capítulo lhe fornecerá uma oportunidade única de ser introduzido ao relato bíblico do início da história do mundo – remoto, sim, mas que consiste na própria base tanto do cristianismo como de toda empreitada educacional neste planeta – e aos princípios básicos da visão de mundo cristã – uma visão religiosa e educacional única, coerente, profunda e verdadeira do início ao fim, como procuraremos demonstrar. Quem sabe, antes de chegar no final deste livro, o poder das verdades e da mensagem cristã nele contidos terão levado seu coração a fazer outras e mais profundas perguntas... cujas respostas podem vivificar e transformar toda a sua vida, e toda a sua educação!

O mais provável, entretanto, é que você seja um educador cristão – no sentido mais amplo possível do termo – e a sua surpresa faça a pergunta soar um pouco diferente: “Educação cristã no Jardim do Éden? É claro que eu conheço o relato bíblico da criação do mundo e de Adão e Eva no Jardim do Éden, mas o que isso tem a ver com a educação cristã? Além disso, a educação cristã não é um subproduto do cristianismo que se originou há cerca de dois milênios? Não seria, portanto, um anacronismo falar em educação cristã antes da vinda de Cristo?” Tecnicamente, talvez sim – biblicamente, não! Trataremos dessa questão logo adiante, e o restante deste capítulo deverá deixar claro que a educação cristã tem o seu verdadeiro início histórico e filosófico nos acontecimentos cruciais e nos princípios revelados neste tempo e lugar da antiguidade, o Éden. As palavras inaugurais de Gênesis 1:1: “No princípio, Deus...” revelam a origem da história da educação, declaram a autoridade da Bíblia como a fonte da história e da filosofia educacional cristã, e exaltam o Deus criador como o Autor e o Fundamento principal da história da educação.

O Éden como o Início da História da Educação Cristã


Para os cristãos que acreditam na Bíblia como sendo a própria palavra inspirada de Deus, o Éden, com todos os seus personagens e acontecimentos, não é um lugar mitológico, mas absolutamente real. É história. É o início da história humana e é também o primeiro momento da história educacional do ser humano. É verdade que a maioria dos livros de história da educação, mesmo os livros cristãos, não vão tão longe. Eles simplesmente começam com a vinda de Cristo, ou consideram brevemente a educação do povo de Israel; no máximo, chegam a tratar de alguma forma de educação ainda incipiente nas comunidades dos “primeiros nômades”. Acreditamos, no entanto, ter bons motivos para começar a contar nossa história da educação remontando ao início de tudo, revelado naquelas palavras inaugurais de Gênesis: “No princípio”.

Ao fazermos isso, estamos conscientemente nos opondo àqueles historiadores que ignoram a verdadeira origem da história humana e da história da educação. O argumento desses historiadores seculares é que não temos provas documentais ou arqueológicas da educação nos períodos anteriores, e – convenhamos – os historiadores evolucionistas estariam em grandes dificuldades se tivessem de definir exatamente o momento histórico em que os seres inferiores se tornaram humanos e experimentaram as primeiras formas de educação. Assim, prevalece a idéia de que o início das coisas é indefinido, não é importante, e está tão distante de nós que não tem nada de proveitoso a nos ensinar.

Que os evolucionistas e materialistas não possam fornecer uma explicação sobre a origem da educação não nos surpreende. Mas como educadores cristãos que somos – que possuímos a revelação de Deus sobre o Gênesis, que cremos que a Bíblia é a palavra inspirada, autoritativa, inerrante e suficiente de Deus, a qual nos foi revelada e nos está acessível como a mais confiável e útil fonte histórica de que precisamos – não podemos ignorar o grande acontecimento da origem da humanidade e do surgimento da educação cristã.

A antiguidade e a unidade da história cristã


Não foi Matthew Tindal, como muitos imaginam, o primeiro autor da tese de que “o cristianismo é tão antigo quanto a criação”.[2] Nós sugerimos essa idéia aqui, cientes de que a teologia bíblica e reformada sempre sustentou essa posição ao defender que a história do cristianismo é, em essência, a mesma história contida no Antigo Testamento e iniciada no tempo e no espaço quando do advento da criação do mundo. O cristianismo, se entendido como a verdadeira religião sobrenatural e revelada na Bíblia, é tão antigo quanto a criação. E a educação cristã, se entendida como um ensino que pressupõe uma visão do mundo como ele é interpretado por Deus nas Escrituras, é, portanto, tão antiga quanto a criação dos primeiros seres humanos.

O que parece acontecer entre historiadores cristãos (especialmente entre os evangélicos e menos entre os reformados) é uma espécie de consenso – até certo ponto justificável, técnica ou didaticamente – que associa o termo cristianismo com o período iniciado pela vinda de Jesus Cristo ao mundo e a educação cristã àquela desenvolvida a partir da igreja primitiva. Muitas vezes, entretanto, isso é fruto de uma teologia que não compreende a continuidade da revelação de Deus e que tem dificuldade de perceber a unidade do plano de Deus revelado na antiga aliança e na nova aliança, e de relacionar a história cristã apresentada no novo testamento com as narrativas bíblicas do antigo testamento, especialmente quando estas entram em conflito aberto com a ciência e com as filosofias atuais, como acontece no debate entre criacionistas e evolucionistas.  O resultado é que muitos, para evitarem maiores dificuldades e escaparem do confronto cultural, acabam com uma visão limitada e fragmentada da história.

Não há descontinuidade de sentido nem de propósito na obra de Deus entre os homens. O Deus dos cristãos que veio ao mundo na pessoa do seu Filho é o mesmo Deus que criou todas as coisas no princípio. O propósito de Deus para a vida, para a cultura, para a educação e para o futuro dos homens é eterno e é um só, desde o princípio, e o será até o final do mundo como o conhecemos. O grande expositor bíblico Martyn Lloyd-Jones enfatiza, nesse sentido, a importância de termos sempre em mente a história toda, de buscarmos uma perspectiva ampla e uma visão distanciada que nos permita compreender as coisas como um todo, e o início da história humana é essencial para essa visão contextual:

... A Bíblia ... raciocina com você. A Bíblia não diz: “Somente vá a Cristo e tudo estará bem”. De maneira alguma. Ela começa em Gênesis. Ela começa com a Criação. Ela quer que você saiba e compreenda porque você é quem você é e porque Deus propõe o que propõe.

Então a Bíblia nos diz que o mundo não é acidental. Ela nos diz que a história não existe sem um começo. Ela nos diz que houve um tempo em que não havia mundo nem história e que Deus, deliberadamente, conforme o conselho da sua própria vontade eterna, decidiu criar, formar um mundo e começar o processo histórico. Você e eu estamos na história e cabe a nós saber alguma coisa sobre este processo.[3]

O Éden como introdução e contexto da história


Você já perdeu o início de um filme e ficou tentando em vão entender a sua trama até que alguém lhe explicou como a história começou, e só então o resto do filme passou a fazer sentido? Isso acontece porque o início de qualquer história contém informações essenciais para a sua compreensão. O início normalmente localiza a história no tempo e no espaço, revela e caracteriza seus personagens, e não raro inclui acontecimentos e eventos cruciais para a continuação da história.

As cenas iniciais da história da educação acontecem no Éden, naquele jardim especial criado por Deus para ser a habitação dos primeiros seres humanos na terra, e as vemos não em tela de cinema, mas nas primeiras páginas das Escrituras Sagradas. Os primeiros capítulos da Bíblia contêm vários assuntos pertinentes à educação cristã, tanto no que diz respeito ao início da história da educação do homem, como também informações e fatos importantes para embasar a filosofia educacional cristã. Eles revelam informações contextuais essenciais para a compreensão de qualquer capítulo ou porção subseqüente dessa história educacional.

Dentre esses assuntos cruciais estão a apresentação do autor da história, a narrativa da origem e da criação do mundo e do homem, a descrição do mundo e da vida humana no estado original de perfeição em que foram criados – com destaque para as características, funções e relacionamentos desse homem perfeito – e em especial a descrição do relacionamento entre o homem e seu Criador divino naquele estado de perfeição, conhecido em termos teológicos como o “pacto adâmico” ou “pacto de obras”.

Esses assuntos compõem o primeiro eixo do tripé (criação – queda – redenção) que fundamenta a visão de mundo cristã e contém as chaves das respostas às questões essenciais enfrentadas por todos os sistemas de pensamento e filosofias educacionais: O que é este universo? De onde ele veio? O que é o homem? Como ele surgiu? Para quê ele está aqui? Qual o seu papel na história? Como ele deve atuar no mundo? O que é a educação? Por que o homem deve ser educado? O que buscamos através da educação? Com que aspectos a educação deve se ocupar? Esses são alguns dos mais profundos e práticos problemas da filosofia educacional e ousamos afirmar que eles não podem ser respondidos satisfatoriamente, senão por meio da indispensável revelação de Deus registrada na Bíblia.

Aplicação Educacional: Sobre a Importância do Início da História


Pressupostos e Princípios:


- A verdade histórica da visão de mundo cristã. Assim como a fé cristã se baseia em fatos históricos (na existência histórica, factual e literal do primeiro Adão em Gênesis, nas obras redentoras de Deus na história do seu povo, da vinda de Cristo como o segundo Adão, que adentrou a história para viver, morrer e ressuscitar ao terceiro dia, e da sua segunda vinda para julgar o mundo no final da história – todos acontecimentos históricos), assim também a filosofia educacional cristã afirma a verdade histórica de sua visão de mundo. Não devemos nos contentar com que a nossa visão de mundo seja meramente tolerada entre tantas outras no contexto pluralista atual, mas precisamos declarar que a única filosofia educacional válida é aquela cuja verdade de seus pressupostos estão firmados em acontecimentos históricos.

 - A importância da origem das coisas. A filosofia e a história educacional cristã, se pretendem seguir o exemplo bíblico, precisam dar um relato convincente e explicativo da origem das coisas (de sua história, filosofia e prática). É bom, saudável e bíblico fazer indagações como: “de onde isso veio?”  Desde quando esse método é usado? Porque adotamos esse determinado material? Qual a história desse professor? Quem são os defensores históricos dessas práticas? Quem inventou a pré-escola, e por quê? Em que contexto práticas escolares que adotamos foram introduzidas? O contexto atual ainda as justifica? Inúmeras e variadas são as aplicações desse princípio de que o início e a origem das coisas é importante, e de que essas questões fundamentais devem ser perguntadas com referência a cada aula, tópico curricular, prática escolar, histórico de cada aluno e professor, etc. Semelhantemente, devemos ter cuidado e desconfiar daquelas filosofias e práticas educacionais recentes, ou que surgem pragmaticamente, cujos resultados não foram testados historicamente, ou daquelas mais antigas que se nos apresentam como ditatoriais e inquestionáveis, ou ainda daquelas que não fazem parte de um sistema de explicação abrangente e tratam só de coisas particulares e metodológicas.

- Do início ao fim a mesma história educacional. A educação brasileira ainda carece de um livro de história geral e brasileira contada da perspectiva cristã, e particularmente de um livro de história da educação cristã. Mas quando esses materiais didáticos surgirem (e esta obra é um convite a esforços nessa direção), se eles forem realmente bíblicos, a sua história deverá começar no Éden, centralizar-se na obra de Cristo na história e finalizar apontando para as revelações do Apocalipse. A história da educação greco-romana, reformada, assim como a brasileira, devem estar devidamente inseridas nesse plano todo-abrangente de Deus.

Direcionamentos Práticos


- Busque explicar às crianças a origem e o porquê das coisas. Volte no tempo o mais longe possível, e sempre que for devido, associe suas explicações ao Éden, a seus personagens e acontecimentos.

- Enfatize a unidade e a totalidade da história bíblica: Seja falando de Abraão, de José, do povo de Israel, de Davi, de Jeremias, de Jesus, ou das viagens missionárias de Atos, busque compreender e dar às crianças uma visão da história toda, do Éden a Apocalipse, e do seu lugar dentro dessa história.

- Busque pesquisar e repensar, como professor ou educador em qualquer área, a origem de suas crenças e práticas educacionais. Certifique-se que há fundamentação bíblica para tudo o que você pensa e faz ou deixa de fazer.

- Se você é um diretor ou administrador escolar, valorize a formação e o interesse histórico, teológico e bíblico nos professores candidatos a qualquer vaga, e incentive formação continuada nessas áreas fundamentais como um instrumento valioso para garantir a sua visão de mundo cristã.

Próximo Post nesta seção: A Bíblia como a Fonte da História da Educação Cristã.




[1] Portela, Solano. Educação Cristã: ([199-], p. 1)
[2] Erroneamente conhecido como o autor dessa tese, Matthew Tindal foi quem a emprestou do sermão de um pregador ortodoxo e a distorceu para defender a sua teologia natural nessa obra que ficou conhecida como “a Bíblia do Deísmo”, na qual ele eleva a Natureza e a Razão em lugar de Deus e descarta a revelação e os milagres, chegando a conclusões radicalmente anti-bíblicas e anti-cristãs.
[3] Lloyd-Jones, Martyn. The Gospel in Genesis: From Fig Leaves to Faith (O Evangelho em Gênesis: De Folhas de Figueira à Fé) (Wheaton: Crossway, 2009), p. 15-16.

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